O dia 29 de abril é bastante significativo pois é dia internacional da dança. Sempre mencionei que essa data deve ter um caráter festivo, mas especialmente é necessário também atentar para questões políticas na e para dança. Sendo assim, encerrar o 1º Congresso de Dança de Salão Contemporânea, nessa data, para mim é bastante significativo. Acima de tudo esse espaço foi potência, elaboração de uma rede de disseminadores de abordagens contemporâneas na dança de salão. Pessoas que estão dentro das diversas áreas que englobam a dança de salão como o espaço de sala de aula, artístico ou social e que vem ao longo de suas pesquisas problematizando suas abordagens. Buscando realizar suas propostas à margem do que está pré-estabelecido, tendo a preocupação de desconstruir comportamentos machistas, abusivos, cis-heteronormativos. Tendo como demanda a construção de espaços de acolhimento, escuta, sensibilidade e mais horizontalizados.
O domingo então começou com a oficina da Companhia Dois Rumos (SP), no qual há uma busca de preparar um corpo capaz de se relacionar com outro de uma forma menos impositiva. Nesse sentido esse coletivo propõem a construção desse pré-corpo através de dinâmicas de sensibilização, de consciência da estrutura óssea, da mobilidade das articulações, entre outras coisas, as quais passam por um processo de percepção do próprio corpo. Embora, o que eu considere mais significativo seja o fato de que através dessa proposta podemos experimentar outras formas de tocar o outro corpo, com tônus, mas sem ser impositivo. Isso passa a ser fundamental para o dançar a dois.
Na sequência rolou a oficina da Débora Pazetto e o Samuel Samways que apresentaram a proposta de condução mútua. Sendo assim, nesse caso não haveria alguém responsável por dar a indicação inicial para a improvisação, nenhum dos componentes da dupla possui esse lugar de indicar o estímulo inicial. A busca se dá por uma perda conjunta que gera o movimento, é no entre os corpos que os agenciamentos vão ocorrendo. A proposta dessa oficina foi justamente trabalhar com essa construção de um corpo expandido capaz de estar sempre em relação ao outro e ao espaço. E ainda buscar princípios de movimentos de deslocamentos de perna a partir desse contato com o corpo expandido.
Durante esse dia, houve a palestra do BeHoppers coletivo de pessoas que movimentam a cena Lindy Hop em Belo Horizonte. A Camila Magalhães e Fabrício Martins apresentaram alguns princípios que apontam porque essa dança a dois sempre possui uma fluidez maior no aspecto da condução e na constituição do par. Para ilustrar os mesmos trouxerem exemplos de vídeos antigos onde homens dançam com homens e mulheres com outras mulheres, sem a necessidade de estereotipar os movimentos. Além disso, o grupo organizou uma campanha intitulada 30 atitudes não machistas na dança de salão, a qual reverberou pelo mundo todo.
Para finalizar as atividades, além do baile que a meu ver se tornou espaço de concretização de todos os debates e oficinas que foram realizados durante o evento, houve uma mesa redonda com as professoras do evento. A temática da mesa tinha como foco os novos rumos da dança de salão. Houve discussões à respeito da necessidade de elaboração de um termo guarda-chuva que comporte todas essas abordagens que possuem ideais comuns, mas que em sua prática e processo de construção acabam se diferindo. Foi trazido pelo público a ausência de representatividade de alguma mulher negra nesse espaço de fala, sendo que todos nós concordamos a importância de possibilitar que esse espaço seja compartilhado e realmente plural. Sendo assim, também foi levantado que todos ali presentes são responsáveis por disseminarem a importância do que estamos discutindo nesse evento, levando para os seus grupos e cidades um pouco do que rolou no evento.
Gostaria de finalizar esses relatos rápidos, salientando a importância desse encontro ter acontecido, no formato o qual ele foi idealizado. O evento contemplou além de uma grade de aulas ministrada majoritariamente por mulheres professoras independentes, algo que não é uma prática comum nesse espaço. Houve ainda uma preocupação de dar conta das questões de representatividade do público LGBTQI+ nos espetáculos apresentados, nas propostas queer de ensinar dança de salão. E por último houve ainda os espaços de discussão os quais trouxerem aspectos teóricos para fundamentar esse movimento e as práticas experimentadas.
Só digo que é fundamental o momento em que vivemos para passarmos a questionar que dança estamos fazendo e dançando. Obrigada a todxs que acompanharam as oficinas, obrigada as pessoas lindas que dançaram comigo nos bailes e tronaram a minha experiência em BH enriquecedora. Somos rede de afetos e potências dançantes. Não há queda, não a chão, não há o outro que possa dizer o que podemos fazer. Somos corpos duplos, somo múltiplos, mas acima de tudo somos fortes e não temos medo de criticar e questionar o que aparentemente está dado.
Obs: amores peço desculpas porque as fotos ficaram um pouco prejudicadas desse dia, mas assim que conseguir já adiciono aqui. 😉